terça-feira, 31 de maio de 2011

               desejos cristalinos
                       suave manhã
                          de sentidos
                                            orgásmicos

               abocanhar a paisagem
                             lamber a pedra
                                                     molhada

               tuas nuvens
         meus cristais de
                                   onda estilhaçada

              doce refúgio de verão










as lembranças da casa rosada
não são minhas
perpassam meus sonhos
como algumas sombras de rugas
ao redor dos olhos
- vívidos e brilhantes –
reflexos de luz do luar

cheiro de piscina
nos cabelos
na cozinha

estou mais pra verde-e-rosa
do que paredes de um sol envelhecido

as insistências mouras
de meu ser
colorem minha tez
intensificam meu sal
corroem o cloro das lembranças inventadas

terça-feira, 17 de maio de 2011

sinto
como se estivesse
velejando
num barco de terra

sua quilha de corais
é profunda e frágil
no leme,
o acaso,
os olhos da beleza e da paixão

como vela,
o próprio vento
numa fusão de todas as forças

navego num iminente desconhecido

sábado, 14 de maio de 2011

De que parte de mim pode vir ou resplandecer este obscuro prazer em estar no limiar inexistente entre o certamente e o não; que de nenhuma forma tende ao improvável, sendo sempre levado ao cerne do alvo eco-regimentado que é a procedência ou a congruência de objetos, de desejos, e dos sopros de infindável leveza e prazer que regem sem cálculo os odores latentes destes, e não de outros, homo-sapiens-demens?

Desde quando, e por onde, e com que motivo tende este espectro, esta sombra, esta névoa feminil, a cogitar em possível êxtase inexplicável (e impalpável até) a improvável serenidade que permeia a mais comentada metamorfose maternal?

É acreditável a despreocupação e quase sorrível possibilidade de gerir vida?

O que se faz quando a percepção está acima da razão, e esta se estabelece em estado letárgico, fazendo-se despercebida e incondicionada; quando o mundo, a vida, dá a sensação de que nada mais deveria ser feito além da insustentável necessidade de apenas ser, humanamente, regido pelos instintos mais fugazes, mais selvagens, mais primais; quando o medo não é mais medo algum, é motor; quando as vontades, aquelas que fizeram voar o primeiro homem, a primeira bruxa, são viris, aguçadas, e são, uma a uma, alimentadas, desfeitas, e ressurgem como dinossauros?

O que se faz quando tudo (tudo) que deu sustentabilidade à existência, à sobrevivência, que fez mover ondas, caminhos, correntezas, areais, vendavais, que fez do sonho de voar a poesia mais doída, que fez da doença do sentir a intensidade do olhar, que fez das lágrimas, dos berros e dos soluços milhões de palavras soltas que bateram ao encontro de corpos quentes e necessitados; o que se faz? o que se faz com o desnecessário que isto se tornou? o que se faz com esta plenitude incongruente que afugenta o esfacelar alimentício do prazer mental e da alma corroída, que somente parece carregar consigo o que de simplesmente belo há no olhar, no estar, no existir sem pressa? o que se faz com o colorido ameno e eletrizante que apenas sabe se fazer num rastro de pureza aveludada?

O que é isto, meu deus, que me toma sem doer, que acomete sem afugentar, que cresce na epiderme sem dilacerar os tecidos, que trama, enovela, urge, surge, encrua, anoitece, envaidece, esverdeia, liquidifica, sonoriza, respira, enlouquece, desvaira, enraivece, desmantela, enleva, dissocia, aprisiona, acorrenta, adiciona, enlameia, corporifica, desmistifica, ressurge, permanece, deseja, arde, sustenta, queima e não esvai, gruda, amacia, lambe, continua?

terça-feira, 10 de maio de 2011

Fotografia dos Sentidos XVI











Arte: F. Minto

no esfumaçado colo de si mesmo
perdeu-se em insanidade.

romper as paredes do corpo
não lhe cabia.

percorreu fluxos incansáveis de vida
dentro de um único lar.

explodir em asas gigantescas de lagarto
foi a sobriedade que lhe restou
para libertar-se.

terça-feira, 3 de maio de 2011

no hay banda

silêncio
jorro espetacular
de navalhas
afiadas

como furar o sol
que se espatifa
em lâminas de gelo

silêncio de pavor
silêncio de amor
silêncio de umas palavras
gritadas
que emudeceram
congeladas

silêncio
o tempo
suspenso do tempo
o tempo
que cai, sem mais,
por fora de mim